14 de fev. de 2011

Casa Branca de Gramido: Utilização Pública ou Privada?


A 1 de Março de 2002, foi assinado um protocolo de acordo, entre o Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, representado pelo então ministro da pasta Eng.º José Sócrates, e a Câmara Municipal de Gondomar, representada pelo então e actual presidente Valentim dos Santos Loureiro. Este protocolo de acordo foi assinado no âmbito do programa europeu Pólis, tendo por objectivo principal a requalificação e valorização da margem ribeirinha de Gondomar, através da criação de um passeio marginal e uma ciclovia, aproveitando simultâneamente as condições naturais e paisagísticas da região a intervencionar.

No conjunto de intervenções a empreender, havia à época uma que se destacava não só pelas verbas envolvidas, como também pelo interesse histórico e patrimonial (não só para a região como para o próprio país).

Falo da histórica “Casa Branca de Gramido”, imóvel de interesse público (“a Casa Branca de Gramido foi adquirida pela Câmara Municipal de Gondomar à D. Rosa Branca Pereira a 28 de Julho de 1989. O edifício está classificado desde 2002 como imóvel de interesse público”), e cuja reabilitação foi adjudicada em 2005 à empresa Sofranda S.A., pela verba de 788.603,51€ (IVA incluído), obra executada e concluída durante os anos de 2005 e 2006.

O projecto da obra de recuperação foi elaborado pelo gabinete de arquitectura Barbosa & Guimarães. Foi o mesmo projecto acompanhado pelo IPPAR, sendo o mesmo submetido ao parecer da CCDR-N e do IEP, com aprovação de ambas as entidades.

Quanto ao objectivo, no plano estratégico, de reabilitação da Casa Branca de Gramido, dizia o mesmo plano “que se justificava plenamente a reabilitação e reconversão para uso público e/ou institucional” (Já se vê aqui uma alteração do espírito do programa Pólis - ao ser utilisada no texto a frase e/ou institucional, que como todos sabemos pode levar a várias interpretações e/ou utilizações - que visa na sua essência a utilização das verbas deste programa únicamente para beneplácito público).

A obra foi inaugurada a 31 de Maio de 2008, numa cerimónia presidida pelo presidente da autarquia .

Do projecto inicial, passaram da criação de 8 salas, 1 posto de turismo e 1 cafetaria com esplanada, para:

- 1 Sala de exposições

- 1 Núcleo documental

- 1 Sala de conferências

- 1 Bar/Cafetaria

- 1 Espaço polivalente

Ou seja, eliminaram-se 4 salas (possívelmente de trabalho) e 1 posto de turismo.

Posteriormente, mais precisamente a 3 de Setembro de 2009, é aprovada em reunião camarária a assinatura de um protocolo com a COFAC CRL, entidade detentora da Universidade Lusófona do Porto, assinatura executada a 5 de Outubro de 2009.

O curioso de todo este processo é que, e segundo o protocolo assinado pelas partes, a Universidade Lusófona, através da COFAC, fica detentora em exclusivo de um imóvel histórico, em regime de comodato (ou seja emprestado), por um período de “5 anos, renovável por iguais e sucessivos períodos, salvo denúncia fundamentada por qualquer das partes, com uma antecedência mínima de 180 dias.

Por outras palavras retiraram (Câmara Municipal de Gondomar e Cofac), do uso público para o uso privado um edifício histórico recuperado com verbas do Pólis Gondomar. Aliás, temos essa confirmação ao ler-mos no site do Grupo Lusófona precisamente isso: “a casa, que foi reabilitada em 2006, dispõe de cerca de 660 m2 que a Universidade Lusófona utilizará da melhor forma em benefício dos seus alunos”.

Ficou a COFAC, à época, obrigada por esse mesmo protocolo “ a implementar uma biblioteca/centro de documentação de história contemporânea considerando que esta se articulará e complementará a oferta da Biblioteca Municipal, podendo ser utilizada pelo público em geral, nas condições do respectivo regulamento de utilização” (considerando G).,

Serão ministrados cursos no âmbito das Ciências aeronaúticas e outros” (considerando H).,

Na 2ª cláusula nº3 lê-se: “é da responsabilidade do comodatário o pagamento de todas as despesas inerentes à utilização, conservação e exploração do prédio cedido”. A verdade porém é bem diferente para quem por lá passa hoje, mais de um ano após a assinatura do protocolo (escrevo este texto a 6 de Novembro de 2010), pois vê um edifício fechado, completamente ao abandono e com falta da tal conservação contratual.

Podemos concluir que, do projecto inicial que previa a recuperação do edifício para usufruto público (daí a sala de conferências, a cafetaria com esplanada, as 7 salas de trabalho e o posto de turismo), tal intenção foi deturpada pela Câmara Municipal de Gondomar ao entregar através desse protocolo, o usufruto do edifício a uma entidade privada, espoliando os gondomarenses de um bem que lhes pertence por direito e pela recuperação do qual pagaram.

Pergunto agora, qual seria a dificuldade de instalar um pólo da Biblioteca Municipal, especializado no período histórico da Patuleia, de fazer exposições itinerantes ou mesmo permanentes, de ceder as inicialmente projectadas salas de trabalho a artesãos e a produtores do conselho, por forma a darem a conhecer o seu trabalho. Muitas mais utilizações poderia ter, bastando para isso que houvesse vontade da CMG, e não a que infelizmente tem neste momento, que é nenhuma.

Para não ser considerado maldizente devo dizer que a Universidade Lusófona fez de facto alguma coisa no edifício (que seja visível): colocou uma placa de latão no exterior a dizer “ Universidade Lusófona do Porto – Escola de ciências aeronáuticas, pós-graduações e especializações Professor Comandante J.A. Sousa Monteiro

Mais uma vez fica demonstrado que a Câmara Municipal de Gondomar, com o aval dos seus órgãos dirigentes, não defende o interesse público, usa os dinheiros públicos, e depois negoceia com empresas privadas o usufruto dos mesmos. Quais são os interesses?


Vergilio Pereira, Gondomar, 6 de Novembro de 2010

Um comentário:

Líricos do Campus disse...

Podemos dizer que agora, devido aos sinais de degradação, que a Casa Branca está ficando coisa preta em regime de incomodato para à Câmara, que, como mau senhorio, não obriga o comodatário às obrigações contratuais de manutenção. Mas, a isso já estamos habituados com o habitual laxismo reinante! Silvino Figueiredo
Nota. Passei por lá e tirei algumas fotos, que mostram uma lição universitária de desrespeito pelo bem público