28 de fev. de 2011

“Direita ajuda o governo na política do desemprego”

Esta quarta-feira, numa sessão pública em Leiria, Francisco Louçã respondeu a questões sobre as razões da moção de censura que o Bloco apresentará em Março e denunciou que a resposta da direita “é para ajudar o governo na política do desemprego”.

A sessão promovida pelo Bloco de Esquerda em Leiria funcionou como um parlamento aberto onde Francisco Louçã expôs a sua intervenção e depois respondeu a várias interpelações do público que colocou questões sobre a utilidade e as razões da moção de censura, mas também sobre a crise e o FMI e sobre as mobilizações sociais e sindicais.

Louçã começou por referir a “extraordinária” revolução árabe, sublinhando as suas origens sociais – a “revolta dos jovens desempregados” [referindo-se à Tunísia e ao Egipto] – e denunciando a hipocrisia dos países ocidentais, nomeadamente os principais da União Europeia (UE), que ajudaram a sustentar os regimes autoritários dando-lhes protecção política. Lembrando que os regimes tunisino e egípcio pertenciam à Internacional Socialista, da qual também o partido de José Sócrates faz parte, afirmou que a protecção dada a estes países se baseava numa garantia de controlo do petróleo e instrumentalização política dos países. “É por isto que a revolução árabe é tão importante, porque denuncia uma Europa que se preocupa mais com a indústria petrolífera do que com a liberdade dos povos”, disse Louçã.

Num segundo momento, Francisco Louçã falou concretamente sobre a moção de censura dizendo que esta é a terceira moção apresentada pelo Bloco e também a mais justificada de todas. Esta terceira moção, afirma Louçã, é contra “a economia cruel que afunda o país”, e responde “pelos 700 mil desempregados, pelos 2 milhões de precários perseguidos por esta economia, por um país que lhes retira vida”.“Nenhuma outra moção tinha sido atacada deste modo”, lembrou Louçã afirmando que “aqueles que arruínam o país querem que tudo fique na mesma”.

Já o governo, disse Louçã, “tem uma obsessão ideológica: tornar o despedimento mais barato e colocar cada trabalhador a pagar o seu próprio despedimento ou o do colega do lado, ou seja, resolver os problemas da economia portuguesa favorecendo o desemprego e baixando os salários”. Este é um modelo de inspiração liberal, sublinhou, “é o modelo da Thatcher e do Reagan, que só origina mais desemprego”.

O coordenador do Bloco de Esquerda considera que a resposta da direita à moção de censura do Bloco é para ajudar o governo na política do desemprego. “A direita quer agarrar o governo para este fazer o pior e desagregar a economia”, sustentou, referindo depois ironicamente a frase de Passos Coelho – “ainda não temos fome para ir ao pote”. “O pote somos nós, são os impostos, é economia, é o estado”, disse.

Louçã acentuou três factos que confirmam a necessidade da moção de censura e demonstram a “elevada degradação social” em que o país se encontra: as recentes estatísticas do desemprego; os resultados dos principais bancos em Portugal que demonstraram que estes pagaram uns juros irrisórios sobre 1500 milhões de euros de lucros e denunciou a “gigantesca tramóia do discurso sobre a distribuição dos sacrifícios“; o “entusiasmo” da direita com as propostas laborais do governo: o CDS quer prolongar os contratos a prazo até 6 anos, o PSD propõe que a Segurança Social – “que é dinheiro de todos os trabalhadores”, lembrou o dirigente bloquista – pague uma parte do salário para que o valor do trabalho seja menor, permitindo aos patrões contratar pagando abaixo do salário mínimo.

Nós não estamos condenados”

O deputado acusa o bloco central, a alternância entre PS e PSD, de ser responsável por esta economia do medo e do desespero: “um como o outro são promotores das políticas do desemprego e entusiasmam-se com as políticas de privatizações”.

É por isto, diz, que a “ a esquerda precisa de ter a capacidade de apresentar uma alternativa”. “Nós não estamos condenados”, afirma Francisco Louçã, e acrescenta que “nós precisamos da força de uma alternativa que ponha na ordem o sistema financeiro, cobre os impostos justos a todos, que crie a sustentação para os serviços públicos e Segurança Social e que nessa base redistribua na população aquilo que é de todos”.

O Bloco quer democracia e justiça na economia e esse é o sentido da moção de censura, reiterou Louçã, afirmando que “não podemos cruzar os braços, nem ficar à espera que aconteça”.

Nos próximos meses corre-se o risco da degradação da economia portuguesa, advertiu, referindo-se à especulação financeira mas também aos planos da UE. “A União Europeia é pior do que o FMI quando cobra juros mais altos à Irlanda e à Grécia do que ao próprio FMI”, disse.

A UE e o FMI têm a mesma receita e só conhecem uma palavra: salário, diz Louçã acusando-os de procurarem fazer os ajustamentos sempre a partir do valor do trabalho, seja a partir do aumento do custo dos transportes, do aumento da saúde, do IVA, do congelamento das pensões, “é sempre ir buscar ao salário”.

Francisco Louçã, in http://www.esquerda.net

23 de fev. de 2011

Iniciativas

O Bloco de Esquerda dá início esta semana a uma série de iniciativas por todo o país contra o FMI, a austeridade e a precariedade. Para este passo de força estão já marcadas sessões públicas de discussão e comícios. Uma novidade será a acção nacional de contacto com desempregados em todos os Centros de Emprego do país, marcada para dia 28 Fevereiro, em que distribuiremos os jornais do Bloco.
Em paralelo foi construído um jogo da glória versão FMI, que será realizado às 17h, no espaço público de cada localidade onde estão marcadas sessões públicas e comícios. Estão todos convidados a participar. Realizámos também a maior tiragem de sempre de jornais do Bloco, 350 mil exemplares, que serão distribuídos por todo o país.

Contacta o teu responsável local e organiza também uma distribuição.

Calendário:
23 de Fevereiro, Leiria - 21.30h, sessão pública no Ateneu Desportivo
24 de Fevereiro, Coimbra - 21.30h, debate no Café Stª Cruz, Praça 8 de Maio
25 de Fevereiro, Porto - 21.30h, sessão pública na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação
28 de Fevereiro, 8.30h/9.30h -
Acção nacional de contacto com desempregados em todos os Centros de Emprego do País
1 de Março, Braga - 21.30h, sessão pública na Escola Secundaria Sá de Miranda
3 de Março, Portalegre - 20h, jantar/comício no Restaurante Castro
4 de Março, Aveiro - 21.30h, sessão pública no Auditório da Junta de Freguesia de Stª Maria da Feira
9 de Março, Lisboa - 21.30h
, comício na Casa do Alentejo

Saiba mais em www.esquerda.net


Sessão Pública, com Francisco Louçã

Não faltes, e traz um amigo!

14 de fev. de 2011

Ai meu deus que vem aí a direita


Uma das respostas mais reveladoras à moção de censura do Bloco de Esquerda foi o rápido alinhamento dos comentadores conservadores e de direita em defesa do governo.

O inefável Santana Lopes grita que isto tudo é insuportável e Pacheco Pereira vocifera desalmadamente como é costume. Mais longe, Passos Coelho reage com calma mas em francês, Marques Mendes fica atrapalhado e Marcelo ainda não disse nada. Os outros, todos, recomendam o apoio ao governo.

Percebe-se porquê. É que a moção critica e recusa a destruição do contrato social que deve proteger os desempregados. E a direita juntou-se ao PS para reduzir o subsídio de desemprego. A moção critica e recusa a vida sem vida que é imposta às gerações sacrificadas, aos trabalhadores que vivem a recibo verde e a trabalho temporário ou a prazo. E a direita juntou-se ao PS para promover os recibos verdes e a precariedade. Dois milhões, quase um em cada dois trabalhadores, desemprecários. Sem futuro, sem vida.

Naturalmente, a reacção de classe da direita leva-a a apoiar todas estas políticas e aliar-se ao governo que as protagoniza. Parece por isso ligeiramente exagerada a reacção de alguns comentadores de esquerda que, ao som da música do PS, vieram brandir o perigo da vitória da direita. A direita está onde sempre esteve, ao lado do PS (e, no futuro, contra o PS). E, porque as sondagens lhe parecem dar vantagem, isso não a torna mais perigosa do que já é agora, com a política que pressiona e impõe.

De facto, quem refere o perigo da direita no futuro quer esconder o perigo da direita no presente. E ela é perigosa. Perigosa e poderosa. Está mesmo a governar, porque é a política de direita que impõe, no final deste mês, a redução da indemnização ou a constituição de um fundo para financiar o despedimento. Se isso não é a direita, então o que é a direita? Se não é a direita que impõe que os dividendos não paguem imposto no caso de um dos maiores negócios do mundo, a venda da Vivo, o que é direita então?

Mas não fujo ao problema das sondagens. O que nos indicam é que, a continuar a degradação da governação, pode haver uma vantagem do PSD sobre o PS. Apesar disso, não estou a ver alguém a atrever-se a dizer que devemos abolir as eleições, para evitar que a direita ganhe. As eleições, a realizarem-se e quando se realizarem, são sempre uma solução e não um risco, porque a democracia é assim: tem o poder de decidir e eleger. A rápida passagem do PS e dos seus arautos para o ponto de vista da "suspensão da democracia" para proteger Sócrates, tem o seu encanto, mas pouca virtude política.

A pergunta que temos que nos fazer é antes porque é que isto acontece, porque é que as sondagens dão o PSD à frente? E a resposta é evidente, mesmo para os cultores do pânico da direita: a responsabilidade total é do governo e da política que pratica.

Do governo, porque não quer nenhum acordo à esquerda. Quer um Orçamento de corte de salários e de aumento de impostos, portanto à direita. Quer alterar as leis laborais para embaratecer o despedimento, portanto à direita. Quer facilitar a isenção fiscal dos bancos, portanto à direita. E esse acordo à direita trouxe o PSD para a ribalta política, ao mesmo tempo que o PS perde os votos de professores, de trabalhadores, de reformados, dos sacrificados da crise. O colapso eleitoral anunciado do PS, que abre o caminho à direita, é simplesmente o efeito da política do PS em aliança com a direita.

Os que nos gritam que a direita vem aí sabem que o PS é hoje o governo provisório do PSD. Sim, a direita tem avançado porque o PS abre a porta. É portanto extravagante pensar que a solução para barrar a direita é o PS, que é o mesmo partido que abre o caminho à direita levando-a ao poder efectivo, que é o da lei económica. O PS traz a direita, não luta contra a direita.

Por isso, pelo contrário, a esquerda tem uma tarefa difícil. Ser oposição e ser portadora de propostas. Ser unitária e saber dialogar com forças diferentes. O Bloco de Esquerda será a força de oposição mais decidida contra as políticas de direita e, por isso mesmo, a força que melhor é capaz de aproximar diálogos abertos e convergentes.

Para vencermos a direita, temos de criar uma esquerda muito mais forte, que junte gente que no PS recusa a facilitação dos despedimentos com independentes e gente de todas as cores que queira uma política pelo emprego e pelo salário.

A moção de censura afirma precisamente essa política. Se nos calamos em relação à política do desemprego, somos seus cúmplices. Se nada fazemos, facilitamos o caminho da direita, agora aliada ao PS e em breve em confronto com todos. Chegamos por isso ao momento da clareza. A esquerda não pode aceitar que Sócrates entregue o hospital público do Algarve ao Ricardo Salgado até 2040, ou o de Braga ao Mello, e que nos cobrem 15% de juro nessa operação. Eu não aceito. Não pode aceitar o congelamento das pensões. Eu não aceito. Não pode aceitar a redução dos salários. Eu não aceito.

Para vencermos a direita, precisamos de ter esquerda. É por isso que a moção de censura propõe políticas novas e concretas, afirmando uma esquerda que junta forças para a alternativa, a política socialista.

Polémica sobre a moção de censura: acerto no tema e na oportunidade

Esta é uma moção táctica de alcance estratégico. Recusa inevitáveis. Se aprovada, trará eleições num tempo que não é o preferido pela direita e onde o socratismo terá reduzida margem para chantagear com o voto útil. Se chumbada, acentua o compromisso do PSD com a decadência do governo.

1. Porque se apresenta uma moção de censura? Desde logo, por razões de censura.

Ainda não conheço o texto que o BE submeterá à AR, mas dou por boas as razões invocadas por F.Louçã:

"Porque é agora que o governo concretiza medidas destruidoras do emprego porque facilitadoras do desemprego: a redução da indemnização pelo despedimento e o fundo para financiar o despedimento. Queremos que elas sejam retiradas, que sejam recusadas e que sejam vencidas, porque vão criar mais desemprego".

Esta crítica justifica a oportunidade: o pacote que o PS apresentou encontra-se em Concertação Social. O anúncio desta moção dificulta a posição do governo e fortalece os argumentos sindicais.

O segundo e o terceiro motivos, ligados entre si, são consistentes com o primeiro, mas não justificam, por si sós, a escolha do momento: o que ambos nos dizem é que esta é uma moção contra as políticas que rompem o contrato social com as novas gerações.

"Chegámos a uma situação insuportável: um em cada dois trabalhadores está desempregado ou é precário. O PS e PSD aprovaram a retirada do subsídio de desemprego a muitos desempregados, e reduziram o montante para os outros".

Há um milhão de recibos verdes, muitos dos quais falsos. E podemos corrigir essa situação de abuso, introduzindo novas regras para o contrato dos falsos recibos verdes".

F. Louçã, in facebook

Uma moção destas, "tipo Deolinda", pode não ser muito "política", mas faz todo o sentido para quem esteja a perder as suas ilusões na capacidade da política para alterar um sistema de vida onde "é preciso estudar para se ser escravo". Com as mais recentes decisões do governo, não é apenas o novo trabalho que continua incerto e precário, é a protecção social que diminui em caso de desemprego. Censura, portanto.

2. A escolha do momento foi a melhor? Foi a única razoável.

O Bloco anunciou a moção para o primeiro dia em que terá utilidade prática, 10 de Março. Ou seja, quando o PR estiver obrigado a pronunciar-se se for aprovada. É, portanto, uma moção para valer.

Se o governo cair por causa desta moção, o bloco é o primeiro responsável. É assim, sem doirar a pílula.

É por isso que se pode concordar ou discordar da moção não apenas em função do seu conteúdo, mas pelas consequências que possa acarretar. O que não se pode é sustentar, no mesmo argumento, que a moção não presta porque é a fingir e... que não presta porque pode vingar. Discussão política, sim, amálgama, não.

3. O que é uma "moção para valer"? É uma moção que se bate pelas razões da censura que apresenta.

Não é nem mais nem menos do que isto. A utilidade de uma moção não depende apenas do seu resultado. Esta é a mais recente "teoria" do CDS que, tanto quanto me lembro, já apresentou ou votou moções que perderam. Se este argumento valesse, jamais se apresentariam moções sem garantia prévia de vitória. Como se sabe, nunca foi assim. Nem em Portugal nem em qualquer outro país com parlamento plural.

Para quem a apresenta e para quem a vota, uma moção de censura é sempre um instrumento de acumulação de forças por ou contra uma política e os seus responsáveis. Se passa ou não passa depende. Vamos então a este "depende".

4. E se o governo cai? Se cair, vamos para eleições, é assim a democracia.

Para algumas pessoas, os resultados dessa putativa eleição estão escritos. Para outras - como eu, por exemplo - não. Mas deixemos o poder de adivinhação a quem de direito e fixemo-nos no essencial: a ninguém ocorre cancelar a democracia pelos riscos que possam trazer os seus resultados.

Pode, isso sim, discutir-se a oportunidade de antecipar essa eleição. As pessoas de esquerda que criticam esta moção, fazem-no por razões de oportunidade, por estarem convencidas de que a direita sairia beneficiada de eleições antecipadas. Sucede que essas mesmas pessoas, independentemente da moção e já antes dela, davam por adquirida, quer a derrota de Sócrates, quer a vitória da direita. O analista que melhor tem resumido esta opinião é o meu amigo Daniel Oliveira. Escreveu ele... 48 horas antes do anúncio da moção, ou seja, desconhecendo-a:

"Que José Sócrates está a prazo já não é assunto de debate para ninguém. Que será sucedido por Pedro Passos Coelho também deixa poucas dúvidas."

In Expresso online

F. Louçã avança uma explicação para a possível progressão da direita:

"Não fujo ao problema das sondagens. O que nos indicam é que, a continuar a degradação da governação, pode haver uma vantagem do PSD sobre o PS. (...) Os que nos gritam que a direita vem aí sabem que o PS é hoje o governo provisório do PSD. (...) É extravagante pensar que a solução para barrar a direita é o PS, o partido que lhe abre o caminho, levando-a ao poder efectivo, que é o da lei económica".

FL, ibidem

Este ponto de vista não é substancialmente distinto do que o próprio Daniel sugere, projectando o futuro:

"Sei que os portugueses demorarão alguns anos a esquecer José Sócrates. Com os maus tempos que aí vêm (...) já não vai bastar a indignação retórica com as privatizações quando privatizou, a defesa intransigente, em palavras, do Estado Social quando se fragilizou o Estado Social ou as reflexões sobre a necessidade da Europa mudar de rumo enquanto se aceita um papel passivo dos países periféricos. O que falta ao PS é consistência e consequência".

Subscrevo o diagnóstico, mas não o fatalismo do Daniel. Acho que vivemos tempos de incerteza, com grande volatilidade nas opiniões. O que hoje parece adquirido, amanhã deixa de o ser e a opinião do analista é uma entre muitas. Não acho que exista uma "vaga de direita"; penso que existe, isso sim, uma fronda de desconfiança face à política que temos. Mas, precisamente, este é o motivo por que o resultado de eventuais eleições não é determinado apenas por Sócrates e Passos Coelho. Encontramo-nos, aliás, ante a possibilidade de um fenómeno novo:

"O descontentamento e a crise podem levar à desagregação da geografia eleitoral, deixando o centro-esquerda em estado comatoso prolongado. Já aconteceu em Itália e em França, nada nos diz que não possa acontecer em Portugal".

DO, ibidem

O autor coloca esta possibilidade na sequência de uma derrota eleitoral de José Sócrates. Mas nada obsta a que ela já seja parte dessa mesma derrota. Por esta ou por aquela razão, são prováveis eleições algures entre 2011 e 2012. Se assim é, a escolha do momento para a queda do governo está longe de ser indiferente. Quando o Bloco anuncia uma moção para 10 de Março não está apenas a dizer que a política do governo deve ser estancada quanto antes. Está também a dizer ao povo que prefere eleições quanto antes. E desculpem lá qualquer coisinha, penso que a maioria do povo pensa exactamente o mesmo.

Com efeito, este é o primeiro ano em que a crise está a ser paga, não apenas pelos desempregados, mas também pelos funcionários públicos, pelos pensionistas e pelos jovens. Com ou sem FMI, o isolamento do governo só pode aumentar com o passar do tempo. Em consequência, de pouco valerá a coerência da esquerda, se nada for feito para comprometer mais ainda a direita com as políticas que a comprometem e que marcam a governação. É por isto que não percebo como se pode criticar a oportunidade da moção BE brandindo a ameaça da direita. A antecipação do calendário político é um dos meios mais eficazes para contrariar as hipóteses de PSD e CDS alcançarem a maioria absoluta.

5. E se o governo não cai? Se não cai é porque o PSD o aguenta...

Não é por acaso que esta moção é um embaraço.

Para os dirigentes do PS, ela é "tresloucada", "irresponsável", "radical", "extremista" e sei lá mais o quê. Ao meu colega Vital Moreira só faltou escrever que os aumentos dos juros da dívida deveriam ser facturados ao bloco. Quando, da banda governamental, a histeria substitui a serenidade... é porque devemos ter acertado.

Para o PSD, a moção é um lindo sarilho, como, aliás, as notícias deste fim de semana confirmam. No laranjal uma mão lava a outra - estar na oposição enquanto se abençoam as políticas de austeridade é "dois em um". Sucede que a moção do BE lhes estraga o arranjinho. Obriga-os a sair do terreno de conforto em que se encontram. Por isso, foram de fino gabarito os epítetos que mereceu: a moção seria "arrogante" (como afirmou Luís Delgado, um pequeno partido não pode ousar liderar a oposição...), "extemporânea" ("o ideal para o PSD era que fosse o PR a dissolver a AR", Luís Delgado bis) e, obviamente e sempre, "irresponsável" - esta foi seguramente de Santana Lopes...

Se o PSD votar contra ou se abstiver, não são apenas os mercados que lhe agradecem. Sócrates e Cavaco não deixarão de respirar de alívio pelo "sentido de responsabilidade" laranja - se for essa a decisão. Neste caso, a moção mostra como existe uma unidade fundamental de propósitos por detrás das guerras de alecrim e de manjerona entre PS e PSD. E isso é positivo e porventura decisivo para o momento em que o país for a votos.

Há alguma verdade quando se critica a moção do BE por esta se dirigir não apenas ao governo, mas também à oposição de direita. Não por causa do que lá venha escrito - espero, sinceramente, que não contenha qualquer referência ao PSD - mas pela definição de campos que impõe. Qualquer que seja a sua posição, o PSD terá enorme dificuldade em a explicar.

Ao invés, já não há qualquer verdade na crítica à moção por esta fazer parte da concorrência entre "os vizinhos do lado". O efeito retórico é interessante, mas não a consequência. Independentemente das opiniões sectárias que existam num e noutro partido, BE e PCP têm interesses convergentes na defesa do mundo do trabalho e contra a ruptura no Contrato Social. Caminham separados porque são muito diferentes nas propostas que apresentam; atacam em conjunto porque defendem valores comuns.

6. E o ónus de derrubar um governo? É verdade, não há bela sem senão.

Quem derrube um governo, por impopular que este seja, paga sempre por esse facto.

Sucede que em política não há decisões sem prós e contras, nem é possível erradicar o risco. A moção pode ser um erro ou um acerto, mas não é reflexo de "desnorte" nem tardio sintoma de "infantilidade".

Mais curioso é o argumento de que a moção representa um balão de oxigénio para José Sócrates. Se fosse verdade, porquê a indignação de quantos receiam, acima de tudo, a ameaça da direita? Lamento desiludir o/a leitor(a) que faça do medo uma conduta: não, não há fins felizes com José Sócrates, porque o homem é o problema 1, 2 e 3 que impede qualquer solução de esquerda para o país. E como o partido não o despacha, terá de ser o povo a removê-lo em eleições. Não sou eu que o digo:

"Os socialistas terão de se preparar para uma longa travessia do deserto. O próximo congresso do PS (...) apenas tornará mais evidente o autismo socialista. Mas vêm aí outros tempos.(...) Depois de José Sócrates, o PS ficará em escombros. Os seus mais fiéis e acríticos seguidores irão tratar das suas vidas. Uns com passagem direta para o novo poder, outros de licença em empresas privadas e públicas, à espera de uma nova vitória. Se o PS os deixar partir de vez (...) quer dizer que aprendeu alguma coisa. Se fica apenas à espera do desastre que será Passos Coelho, então esperemos que a travessia do deserto seja mesmo muito longa."

DO, ibidem

Não tenho pontos de vista tão definitivos, mas isso deve ser da idade. Em matéria de predição sou razoavelmente moderado. Por exemplo, tenho menos expectativas numa liderança mais à esquerda (bem precisaríamos dela, todos), mas em contrapartida não faço votos para desertos a perder de vista.

Muito menos subscrevo a tese segundo a qual "com a guinada à direita a que a política nacional vai assistir, o bloco central não tem qualquer futuro". Bem pelo contrário, o bloco central institucional (entre governo e presidência) só não se transformará em bloco central orgânico se os dois partidos da direita não obtiverem a maioria absoluta. Se a alcançarem precisam absolutamente de um PS, ainda para mais enfraquecido, num grande governo de "união nacional". Nenhum governo de maioria absoluta à justa estará em condições de gerir o PEC IV, o PEC V e o que mais se verá. Isso já é verdade hoje, sê-lo-á ainda mais em 2012.

Esta é, portanto, uma moção táctica de alcance estratégico. Recusa inevitáveis. Se aprovada, trará eleições num tempo que não é o preferido pela direita e onde o socratismo terá reduzida margem para chantagear com o voto útil. Se chumbada, acentua o compromisso do PSD com a decadência do governo.

Não, nada está escrito a não ser o que o se vai escrevendo. E nós escrevemos.

Casa Branca de Gramido: Utilização Pública ou Privada?


A 1 de Março de 2002, foi assinado um protocolo de acordo, entre o Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, representado pelo então ministro da pasta Eng.º José Sócrates, e a Câmara Municipal de Gondomar, representada pelo então e actual presidente Valentim dos Santos Loureiro. Este protocolo de acordo foi assinado no âmbito do programa europeu Pólis, tendo por objectivo principal a requalificação e valorização da margem ribeirinha de Gondomar, através da criação de um passeio marginal e uma ciclovia, aproveitando simultâneamente as condições naturais e paisagísticas da região a intervencionar.

No conjunto de intervenções a empreender, havia à época uma que se destacava não só pelas verbas envolvidas, como também pelo interesse histórico e patrimonial (não só para a região como para o próprio país).

Falo da histórica “Casa Branca de Gramido”, imóvel de interesse público (“a Casa Branca de Gramido foi adquirida pela Câmara Municipal de Gondomar à D. Rosa Branca Pereira a 28 de Julho de 1989. O edifício está classificado desde 2002 como imóvel de interesse público”), e cuja reabilitação foi adjudicada em 2005 à empresa Sofranda S.A., pela verba de 788.603,51€ (IVA incluído), obra executada e concluída durante os anos de 2005 e 2006.

O projecto da obra de recuperação foi elaborado pelo gabinete de arquitectura Barbosa & Guimarães. Foi o mesmo projecto acompanhado pelo IPPAR, sendo o mesmo submetido ao parecer da CCDR-N e do IEP, com aprovação de ambas as entidades.

Quanto ao objectivo, no plano estratégico, de reabilitação da Casa Branca de Gramido, dizia o mesmo plano “que se justificava plenamente a reabilitação e reconversão para uso público e/ou institucional” (Já se vê aqui uma alteração do espírito do programa Pólis - ao ser utilisada no texto a frase e/ou institucional, que como todos sabemos pode levar a várias interpretações e/ou utilizações - que visa na sua essência a utilização das verbas deste programa únicamente para beneplácito público).

A obra foi inaugurada a 31 de Maio de 2008, numa cerimónia presidida pelo presidente da autarquia .

Do projecto inicial, passaram da criação de 8 salas, 1 posto de turismo e 1 cafetaria com esplanada, para:

- 1 Sala de exposições

- 1 Núcleo documental

- 1 Sala de conferências

- 1 Bar/Cafetaria

- 1 Espaço polivalente

Ou seja, eliminaram-se 4 salas (possívelmente de trabalho) e 1 posto de turismo.

Posteriormente, mais precisamente a 3 de Setembro de 2009, é aprovada em reunião camarária a assinatura de um protocolo com a COFAC CRL, entidade detentora da Universidade Lusófona do Porto, assinatura executada a 5 de Outubro de 2009.

O curioso de todo este processo é que, e segundo o protocolo assinado pelas partes, a Universidade Lusófona, através da COFAC, fica detentora em exclusivo de um imóvel histórico, em regime de comodato (ou seja emprestado), por um período de “5 anos, renovável por iguais e sucessivos períodos, salvo denúncia fundamentada por qualquer das partes, com uma antecedência mínima de 180 dias.

Por outras palavras retiraram (Câmara Municipal de Gondomar e Cofac), do uso público para o uso privado um edifício histórico recuperado com verbas do Pólis Gondomar. Aliás, temos essa confirmação ao ler-mos no site do Grupo Lusófona precisamente isso: “a casa, que foi reabilitada em 2006, dispõe de cerca de 660 m2 que a Universidade Lusófona utilizará da melhor forma em benefício dos seus alunos”.

Ficou a COFAC, à época, obrigada por esse mesmo protocolo “ a implementar uma biblioteca/centro de documentação de história contemporânea considerando que esta se articulará e complementará a oferta da Biblioteca Municipal, podendo ser utilizada pelo público em geral, nas condições do respectivo regulamento de utilização” (considerando G).,

Serão ministrados cursos no âmbito das Ciências aeronaúticas e outros” (considerando H).,

Na 2ª cláusula nº3 lê-se: “é da responsabilidade do comodatário o pagamento de todas as despesas inerentes à utilização, conservação e exploração do prédio cedido”. A verdade porém é bem diferente para quem por lá passa hoje, mais de um ano após a assinatura do protocolo (escrevo este texto a 6 de Novembro de 2010), pois vê um edifício fechado, completamente ao abandono e com falta da tal conservação contratual.

Podemos concluir que, do projecto inicial que previa a recuperação do edifício para usufruto público (daí a sala de conferências, a cafetaria com esplanada, as 7 salas de trabalho e o posto de turismo), tal intenção foi deturpada pela Câmara Municipal de Gondomar ao entregar através desse protocolo, o usufruto do edifício a uma entidade privada, espoliando os gondomarenses de um bem que lhes pertence por direito e pela recuperação do qual pagaram.

Pergunto agora, qual seria a dificuldade de instalar um pólo da Biblioteca Municipal, especializado no período histórico da Patuleia, de fazer exposições itinerantes ou mesmo permanentes, de ceder as inicialmente projectadas salas de trabalho a artesãos e a produtores do conselho, por forma a darem a conhecer o seu trabalho. Muitas mais utilizações poderia ter, bastando para isso que houvesse vontade da CMG, e não a que infelizmente tem neste momento, que é nenhuma.

Para não ser considerado maldizente devo dizer que a Universidade Lusófona fez de facto alguma coisa no edifício (que seja visível): colocou uma placa de latão no exterior a dizer “ Universidade Lusófona do Porto – Escola de ciências aeronáuticas, pós-graduações e especializações Professor Comandante J.A. Sousa Monteiro

Mais uma vez fica demonstrado que a Câmara Municipal de Gondomar, com o aval dos seus órgãos dirigentes, não defende o interesse público, usa os dinheiros públicos, e depois negoceia com empresas privadas o usufruto dos mesmos. Quais são os interesses?


Vergilio Pereira, Gondomar, 6 de Novembro de 2010

OUTROS COMBATES VIRÃO

Na noite eleitoral Cavaco Silva congratulou-se com o facto de não ter usado cartazes na sua campanha, na realidade ele foi o candidato mudo, sem cartazes e sem respostas ás perguntas, uma das consequências desta estratégia do silencio foi afastar os eleitores da politica, procurando passar a ideia de que não era politico, e assim esconder as suas responsabilidades pelo estado a que o pais chegou.

Mas nós não nos esquecemos nem temos a memória curta sabemos bem de que ele é responsável pela actual crise, desde os tempos de ministro das finanças, até aos de 10 anos como 1º ministro, com o desmantelamento de mais de 800 kms de linha férrea e das cargas policiais ainda na memória de muitos como foi na ponte 25 de Abril.

No dia 23 de Janeiro a esquerda perdeu e deve não só reconhecer que perdeu como encontrar o caminho para recuperar a capacidade de iniciativa do movimento popular.

A eleição á primeira volta do mais importante líder da direita Portuguesa nos últimos 25 anos, representa uma derrota para as esquerdas sociais e politicas, este resultado favorece as pressões para medidas complementares de austeridade que aplicam as orientações clássicas do FMI e antecipam a sua tutela.

Não foi por acaso que logo na noite das eleições o governo veio oferecer-se para colaborar com o sr. Presidente e como prova da sua boa vontade reuniu-se com o patronato, para este poder despedir os trabalhadores, reduzindo o valor das indemnizações a que os trabalhadores tem direito, por sua vez o Presidente reeleito não perdeu tempo e logo convocou os principais banqueiros os verdadeiros responsáveis pela crise para lhes agradecer o apoio e ver novas medidas para agravar ainda mais a crise.

Devemos analisar os resultados de Cavaco Silva pois nem tudo lhe correu bem apesar de ter ganho não devemos esquecer que perdeu meio milhão de votos e obteve o menor numero de votos comparado com todas as reeleições.

É verdade que Manuel Alegre sofreu uma derrota clara, reduzindo a sua votação com menos 300 mil votos não conseguindo impor uma segunda volta como era seu objectivo, apesar de ter sido o candidato da oposição mais votado.

Manuel Alegre não perdeu por o seu discurso se situar á esquerda, nem por ter tido o apoio do BE ou de independentes de esquerda ou mesmo do MRPP. Manuel Alegre perdeu porque uma parte do PS decidiu favorecer directamente a eleição de Cavaco Silva, e porque a situação social criada pela acção do governo inibiu o voto de muitos outros desgastados e desiludidos com as suas politicas.

Como os resultados demonstraram, só Manuel Alegre estava em condições de disputar uma segunda volta contra o candidato da direita, e não se venha dizer como alguns o tem dito que Manuel Alegre era um candidato comprometido com as politicas do governo, quem não se lembra em eleições anteriores do apoio a Salgado Zenha, e a Jorge Sampaio. Julgo não haver nenhuma duvida de que Manuel Alegre está muito mais á esquerda do que qualquer um dos nomes anteriores.

Este é o Momento das Esquerdas Encontrar Caminhos que nos Levem a Juntar Forças e não a Desperdiçá-las.


Rui Nóvoa, artigo de opinião para o jornal Vivacidade de Rio Tinto, Gondomar, 3/02/2011